quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Momento obrigada Universo # (ainda) sobre a escola primária (e a vida)




Juro que fico de boca aberta quando o universo, ou o algoritmo, ou o acaso, me presenteia com momentos preci(o)sos , no momento certo. Mas logo hoje, quando me preparava para trocar ideias e dúvidas com uma amiga e mãe sobre as nossas filhas e a escola, ter esta frase escarrapachada no ecrã do telemóvel, foi arrepiante. Mas vamos por partes.

Tenho a sensação que um professor hoje em dia, se encontra refém das condições em que trabalha. Dos números e das metas curriculares e dos conteúdos programáticos. Digo os professores de hoje porque me parece que as mudanças ocorridas na sociedade, na família e no sistema educacional, mudaram a realidade, mas não a sala de aula. Aliás até agravaram. As novas relações familiares, a falta de limites das crianças, a invasão inovadora da modernidade, a falta de tempo e as exigências cada vez mais absurdas a troco de quase nada, a falta de preparação dos professores, a imaturidade das crianças, minam as relações entre todos, educadores e pais e crianças e o seu papel, num momento em que paradoxalmente  se espera que a escola assuma cada vez mais tantas atribuições complexas, para além das tradicionalmente desenvolvidas. Não aceito por isso comparações com os outros tempos, os de antigamente, porque são precisamente outros tempos. Mas também não aceito que se criem ansiedades e frustrações desnecessárias, tanto a um professor como a um aluno, por não conseguir cumprir em muito menos que uma ano os 69 pontos das metas curriculares de português ( que ainda nem fui ver as restantes disciplinas). Ler um texto com articulação e entoação razoavelmente corretas e uma velocidade de leitura de, no mínimo, 55 palavras por minuto. À sério ?! Alguém que me explique como se eu tivesse 6 anos porque raio a velocidade e a quantidade de letras que lemos é relevante à nossa aprendizagem? E se só dissermos 54 em 62 segundos? Pois parece que não ficamos retidos no primeiro ano e depois lá vamos nós para o segundo com muitos mais problemas. Tudo isto me soa a fracasso em vez de construção. Toda esta frustração só gera medo e ansiedade, que depois se reflete em acções desproporcionadas e descabidas, sem sentido nenhum. Quem é que no seu perfeito juízo castiga uma criança por esta não estar com problemas no processo de aprendizagem, que ainda está a decorrer?  Quem está cansado, irritado, frustrado, desnorteado.

Então, se o desejo da sociedade é construir homens fortes, precisamos rever nossos conceitos educacionais e travar uma batalha contra essa invasão de que  tudo parece ser normal. Os pais estão perdendo os filhos para um fantasma que os assombra por muito tempo, e eles não sabem como exorcizá-lo: o fantasma da ausência. O mundo acelerado exige que se trabalhe cada vez mais para que os filhos possam ter mais. Porém, será que apenas isso os satisfaz? Será que não seria muito mais significativo para uma criança uma conversa ao pé da cama ou um beijo de boa-noite do que um telemóvel novo? Será que uma visita repentina à escola não faria mais efeito do que o aparecer apenas na festa de final de ano? Existem educadores que nunca viram os pais dos seus alunos. A escola passou a ser um orfanato. Os complexos dos adolescentes e adultos — baixa autoestima; a insegurança para dar os primeiros passos, escolher uma profissão, mudar de emprego; ou até mesmo fáceis tarefas como escolher uma roupa — serão sempre reflexo da infância sem limite. Quando percebermos que a solução para esses conflitos é o seio de uma família bem alicerçada pelo respeito, pelo amor e pelo afeto ao próximo, grandes conflitos mundiais serão solucionados, porque todos eles são de ordem pessoal. Será difícil construir uma rocha, mas colher migalhas perdidas no caminho será sempre impossível. Assim Caminha a Humanidade tem sido a desculpa mais comum entre muitos, porque, muitas vezes, eles mesmos desconhecem onde cometeram os primeiros erros.

As crianças não precisam de manual para ser compreendidas, precisam de pais que assumam compromissos, que saibam que há uma enorme diferença entre criar e educar. Crianças educadas são fortes emocional e fisicamente, crianças criadas são apenas fortes fisicamente e gastam essa energia de forma errada. Limitar é ensinar a tolerar frustrações. É prevenir para que, no futuro, uma dificuldade qualquer não se transforme em uma barreira intransponível. Limitar é ensinar que todos temos direitos, mas deveres também. Limitar é mostrar que o outro também deve ser considerado quando nos decidimos a agir, que nunca devemos pensar apenas em nós mesmos, mas, sim, compreender que vivemos em grupo — ou seja, convivemos. É, antes de tudo, preparar nossos filhos para o exercício da cidadania. É, pois, uma parte importante do trabalho educacional da família. Um pai e uma mãe conscientes não se deixam levar pelo medo do que está acontecendo pelo mundo fora; ao contrário, tudo o que acontece na sociedade deve servir de base para encontros e conversas com os nossos filhos. E, finalmente, dar limites é dar responsabilidade, o que implica tornar nossos filhos, mais cedo, adultos responsáveis. É preciso saber educar sem culpa. É preciso  falar e debater entre pais, educadores e professores. É preciso agir e é já. Aviso já que não aceito que me digam que estou a exagerar.


* Frase de Frederick Douglass

 Deixo também o link que vos leva ao burocrático do programa e metas curriculares de português do ensino básico

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